V CONGRESSO BRASILEIRO PSICOLOGIA: CIÊNCIA E
PROFISSÃO
Psicologia, Direitos Sociais e
Políticas Públicas: Avanços e Desafios
Tipo de
atividade: Simpósio Ciência e Profissão
Nome do
Coordenador: Angela Hiluey
Título do
Simpósio Ciência e Profissão: Formação em Psicologia e Psicoterapia: Princípios
e Metodologia
Eixo I: A
psicologia e a superação das desigualdades no acesso e qualidade da formação em
psicologia
Área:
Processos Formativos de Psicólogos
Palavras
chave (3): Psicologia; Ser humano; Psicoterapia; Significação própria
Nome do
Autor 2: Elcie F. Salzano Masini
Instituição
de origem Autor 2: FE-USP
Financiador
do Autor 2: NA
Título da Fala do Autor 2: O Aprender Sobre o
Atendimento ao Ser Humano
Resumo:
Identificamos – nos com aqueles que consideram a
Psicologia e a Psicoterapia o campo das ciências humanas que visa à compreensão
do homem (de sua natureza) e utiliza recursos para facilitar sua auto -
compreensão, identidade e auto – realização, prevenindo desvios ou atrofias. A linha
central está em propiciar seu desenvolvimento harmonioso e a consciência de seu
próprio significado, no contexto onde age, avaliando o significado em relação
ao seu desenvolvimento global. A proposta é a ação da Psicologia e da
Psicoterapia para salvaguardar a identidade e significação própria do ser
humano: estudo das condições para que adquira consciência de seu papel em um
determinado lugar e momento, crença na própria significação e atue na convicção
de que suas ações podem ter alguma influência. O Procedimento metodológico que
auxiliaria os formadores de psicólogos e de psicoterapeutas a atingirem esses
objetivos e qualidades necessárias em sua ação junto ao ser humano, com vistas
a seu desenvolvimento integral é o implicado nas condições da Aprendizagem
Totalizante – que envolve consideração à pessoa que aprende e às suas
experiências para propiciar – lhe condições de compreensão do ensinado –
imbrica conceitos da Teoria de Aprendizagem Significativa de Ausubel e do
Aproximar – se, da Análise Existencial (Daseinsanalyse) de Heidegger, segundo
Boss (Cf. 1976).
Esta
comunicação busca aprofundar reflexões sobre o processo de aprendizagem do ser
humano, e o uso de sua capacidade de compreender, elaborar e tomar decisões em
situações pessoais e profissionais. Delineia-se a partir de convicções
referentes ao sujeito no ato de aprender e às condições envolvidas nesse
processo.
O ato de
aprender
Denominação à ação do sujeito durante o seu
processo de aprendizagem e a consciência que ele tem do que realiza. A escolha do Ato de
Aprender, como unidade de estudos, tem o propósito específico de investigar as
condições necessárias para que o ser humano, em sua individualidade, adquira
conhecimentos fazendo uso da percepção e da própria capacidade de elaboração,
de forma espontânea e criativa.
O conhecimento das condições em que ocorre o Ato de Aprender implica o
estudo do sujeito do conhecimento em sua individualidade, na complexidade das
interações corporais, afetivas, cognitivas, individuais e coletivas, no tecido
dos acontecimentos, ações, interações, retroações, determinações e acasos que
constituem o contexto social em que se situa.
O
sujeito do conhecimento aqui concebido tem
como característica fundamental a possibilidade de perceber, de atribuir significados
e de estar aberto ao que está ao seu redor. A abertura - característica
fundamental da natureza humana[1] – é entendida como a condição individual de dispor de
muitas maneiras diversas de se relacionar
e selecionar aquilo para o qual se volta. O perceber acontece na relação dessa
possibilidade humana de estar aberto àquilo que a ele se mostra. Assim, pela percepção humana as coisas ao redor sâo
tematizadas, e pela compreensão as coisas podem ter significado no mundo de um
ser humano. Essa união da percepção e da compreensão é que tornam possível ao
sujeito, na sua individualidade, significar.
Este estudo está voltado para o compreender na experiência vivida, no
deslocamento do referencial esquematizado e abstrato da aprendizagem e do risco
da obtenção de informações fragmentadas e isoladas, para um processo dialético
complexo da aprendizagem de cada pessoa no seu contexto de vida, em busca da
integração de experiências e fundamentações teóricas.
Compreender
O verbo compreender (do latim compraehendere), no seu sentido etimológico em Português tem
vários significados, de acordo com Houaiss (2009, p. 507):
conter
em si, em sua natureza; estar ou ficar incluído; abranger(-se); estender a sua
ação a; apreender (algo) intelectualmente, utilizando a capacidade de
compreensão, de entendimento; perceber, atinar; fazer para si uma concepção
ideal e pessoal de (determinada coisa ou pessoa).
Apontar qualquer um desses significados para definir de antemão um
posicionamento sobre o tema em questão, seria uma simplificação inconsistente
com a reflexão que esta comunicação propõe desenvolver.
Das áreas
que investigam a compreensão: esboço de uma teoria cognitivista de aprendizagem
David Ausubel (Cf. 1963), na vertente
cognitivista-construtivista, propôs a Teoria da Aprendizagem Verbal
Significativa - uma explicação teórica do processo de aprendizagem. A
preocupação do autor com a aprendizagem escolar, com as condições que
propiciassem a quem aprende a compreensão do que lhe era ensinado, foi o fator
desencadeante dessa teoria. Definiu, assim, aprendizagem significativa aquela
em que a compreensão do novo conhecimento é adquirida e construída pelo
aprendiz, por meio da interação com algum conhecimento prévio que ele dispõe.
Desvendar
o que o aluno “já sabe” requer consideração à totalidade do ser cultural/social
em suas manifestações e linguagens corporais, afetivas, cognitivas. Implica
consciência do professor, sobre o processo relacional no qual ele próprio está
contido como participante do mesmo contexto cultural e social em que se dá o
ensino, submerso nos mesmos valores, linguagem e conceitos de seu aluno.
A
complexidade do aprender e das imbricações do processo relacional em suas
múltiplas dimensões psicológicas, sociais, culturais estão presentes e
constituem o cenário no qual será focalizada a seguir a aprendizagem por
compreensão e a aprendizagem por reflexão.
Aprendizagem
por compreensão
A aprendizagem significativa de Ausubel é uma
aprendizagem por compreensão. É aquela que:
[...] caracteriza-se pela interação entre o
novo conhecimento e o conhecimento prévio. Nesse processo, que é não-literal e
não arbitrário, o novo conhecimento adquire significados para o aprendiz e o
conhecimento prévio fica mais rico, mais diferenciado, mais elaborado em termos
de significados, e adquire mais estabilidade (MOREIRA, 2005, p. 13).
De
acordo com essa teoria, a estrutura de conhecimento do ser humano, denominada
pelo autor estrutura cognitiva, é organizada e constituída de conceitos e
proposições e propriedades representacionais das palavras. Se a estrutura
cognitiva é organizada adequadamente, é mais fácil a aprendizagem e a retenção
de um assunto novo. A disponibilidade e a clareza no uso das palavras (conceitos
ou proposições) é que contribuem para a organização e elaboração das novas
informações. Devido à importância da linguagem, o autor denominou sua teoria Aprendizagem Verbal Significativa.
O
significado, segundo Ausubel, é um produto "fenomenológico", que
surge no processo de aprendizagem quando o significado potencial, ou conteúdo
de uma área de conhecimento, converte-se em conteúdo cognitivo, diferenciado
para um determinado indivíduo.
Os
cognitivistas têm compartilhado a crença de que uma pessoa em situações de
educação formal ou não formal pode aprender por compreensão e adquirir
significados, independente do ensino. Da
mesma forma, em situação de educação formal pode ocorrer a repetição de
informações, sem que o aprendiz tenha desenvolvido aprendizagem significativa,
ou compreendido o que foi ensinado.
Ausubel,
insatisfeito com o ensino que não propiciava aos alunos o uso de seu potencial
para compreender e adquirir novos significados, aprofundou estudos sobre o
processo de aprendizagem. Buscou uma proposta que fizesse da escola o local
apropriado para que conceitos e ideias fossem adquiridos por meio da capacidade
humana de compreender.
Sua contribuição específica foi ter
sistematizado recursos e princípios para estabelecimento de condições facilitadoras
para ocorrência de aprendizagem por compreensão que, devidamente fundamentados,
foram estruturados em sua Teoria da Aprendizagem Significativa.
Aprendizagem
por reflexão
A aprendizagem por solução de problemas – ou
por reflexão - na educação formal é parte integrante da Teoria de Aprendizagem
Significativa. Constitui um processo mais complexo que o da aprendizagem de
aquisição de conceitos e ideias, como afirmam Ausubel e Robinson (1969); traz
implícita a ideia de um hiato entre o conhecimento que o estudante dispõe e o
que tem que alcançar para a solução do problema. Quando a referência é a
problemas em matemática, geografia e desenvolvimento social, ou outra
disciplina, esse hiato pode ser preenchido pela retomada ou transformação das
proposições conhecidas sob a orientação do padrão de regras na área de estudo.
Nessas situações, a sequência bem definida pode resultar na solução do problema
pela aplicação direta do conhecimento reorganizado a partir do padrão de
regras, constituindo uma solução por repetição. Um verdadeiro problema, no
entanto, não envolve uma sequência invariável de transformações e comporta
sempre um elemento pessoal do solucionador, que responde a questões como as que
seguem. A situação, ou tema, constitui um problema para ele? Quais os
conhecimentos que entram em jogo? Qual a ordem que o solucionador estabelece
para buscar a solução?
Se o estudante tiver domínio de conceitos e
ideias relevantes sobre o tema poderá compreender a natureza e a questão
central do problema. Se não tiver, terá que destrinchar os significados de cada
conceito envolvido para depois compreender a proposição como um todo.
A compreensão da questão central é relevante
porque propicia ao solucionador:
- definir o objetivo a
ser atingido no processo de solução do problema;
- definir a própria
posição com relação ao problema e as bases iniciais sobre as quais o raciocínio se constituirá;
-
propicia perceber o hiato entre seu conhecimento e o conhecimento requerido
para a solução do problema.
Quanto
mais eficientemente o solucionador do problema definir esses três itens, mais
condições terá para o estabelecimento de suas próprias estratégias, para um
processo contínuo de verificação de seus passos e questionamentos, até alcançar
o encaminhamento para a solução do problema; o que ampliará sua compreensão na
área de estudos em que se localiza o problema.
Ausubel
faz referência à incompletude encontrada nas investigações sobre a
aplicabilidade da aprendizagem de solução de problemas à vida real; sobre os
limites da aplicabilidade desses processos racionais a genuínos problemas em
particular. Sugere como explicação possível a ocorrência de uma transferência
negativa: a experiência de solucionar problemas em matemática, levou o
solucionador a uma intolerância à ambiguidade e uma valorização excessiva de
asserções lógicas, o que o limitou nas experiências mais amplas de solução de
problemas.
São
citados a seguir alguns fatores que influenciam positivamente a solução de
problemas: compreensão da direção e decisão na escolha dos pontos a atacar;
focalizar o problema a ser resolvido e não aspectos irrelevantes; clareza nas
implicações e aplicabilidade de seus conhecimentos; processo ativo de pesquisa
e compreensão do problema; seguir uma linha persistente de raciocínio para
chegar a conclusões lógicas; autoconfiança nas próprias habilidades e sem desencorajado
pela complexidade[2].
Sintetizando
o que ficou exposto pode-se dizer que a aprendizagem de solução de problemas é
caracterizada pela reflexão, isto é pelo pensar, relacionar conceitos,
princípios e informações. Para
ocorrência de aprendizagem de solução de problemas é necessário que: o
problema exista para o aluno e tenha significado para ele; o aluno tenha
disposição para querer solucionar o problema. A aprendizagem por reflexão
requer que o aprendiz: domine os conceitos com os quais irá trabalhar para a
solução do problema; analise se entendeu a natureza do problema e se possui
material necessário para trabalhá-lo. Por parte do professor é necessário que
seja orientado a usar os erros do aprendiz para reavaliar os passos dados para
a solução do problema; que sejam oferecidos exercícios que o desafiem em termos
de um obstáculo a ser removido, porém sem frustrá-lo.
Comentários Finais
Esta comunicação
buscou aprofundar
reflexões sobre o processo de aprendizagem do ser humano, e o uso de sua
capacidade de compreender, elaborar e tomar decisões em situações pessoais e
profissionais, tendo como linha diretriz a concepção de Bakhtin de que a
compreensão plena é fruto do diálogo.
Os
dados de pesquisas sobre o uso da reflexão em situações mais amplas de
contextos de vida[3],
não mostraram que a aprendizagem de solução de problemas na escola havia
auxiliado a solução de problemas do cotidiano. Os autores levantaram hipóteses
a respeito propondo novas perguntas em busca de uma compreensão mais ampla
sobre o uso da capacidade de compreensão e reflexão nos problemas da vida
diária.
Referências
Ausubel, D. P. The
psychology of meaningful verbal learning: An Introduction do School
learning. New York: Grune and Stratton, 1963.
Ausubel, D.P. Educational
psychology: A cognitive view. New York: Holt, Rinehart &Winston,
1968.
Ausubel, D. P.; ROBINSON,
F. G. School learning. An Introduction to Educational Psychology. New York: Holt, Rinehart &
Winston, 1969.
BAKHTIN, M. A estética da criação verbal. Tradução
de Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
CYTRYNOWICZ, D. Psicoterapia uma
aproximação Daseinsanalítica. Daseinsanalyse, 1978, n. 4, p. 27-48.
HOUAISS, A. Dicionário Houaiss da
Língua Portuguesa. Rio de
Janeiro: Objetiva, 2009.
MOREIRA, M. A. Aprendizagem Significativa
Crítica. São
Leopoldo: Impressora Portão Ltda, 2005
NUNES JUNIOR, A. T. A
pré-compreensão e a compreensão na experiência hermenêutica. Jus
Navigandi, Teresina, ago. 2002. Disponível em:
SEVERINO, A. J. Filosofia. (Coleção
Magistério. Série formação geral). 2. ed. São Paulo: Cortez, 2007. ISBN
978-85-249-0410-3.
[1] Adota-se aqui o sertido
de abertura de Heidegger, como a define Cytrynowicz (1978, p.16): “Se ha
algo que é essencialmente da natureza humana é a abertura. É para isso que
Martin Heidegger nos chama a atenção em sua ontologia fundamental. O homem é
essencialmente ser-aberto diante do que vem a seu encontro”.
[2] Cf.
Ausubel e Robinson, 1969.
[3] Cf. Ausubel e Robinson, 1969.