A ESTRUTURA DA ANÁLISE
A Estrutura da análise Psicoterapia Analítica
Psicoterapia Analítica ( Carl Gustav Jung).
Texto elaborado por: Dra. Denise H. Tinoco.
A Estrutura da Análise.
Na Psicoterapia Analítica a relação deve ser frente a frente, mas também pode ser usado o divã.
A escola Desenvolvimentalista, propõe um trabalho psicoterápico com encontros que ocorrem de 3 a 4 vezes por semana, mas a maioria dos psicoterapeutas Junguianos trabalham com seus pacientes 1 a 2 vezes por semana, tudo depende da gravidade do
caso.
Os honorários variam e devem ser negociados em bases individuais. Podem ser pagos por sessão ou por mês.
O pagamento deve ser feito diretamente ao analista, pois conteúdos que envolvem dinheiro geralmente tem significados inconscientes que devem ser trabalhados.
Cobra-se do paciente, mesmo quando este falta às sessões, pois além de ser um horário comprado pelo paciente, as faltas podem significar resistência e deve-se trabalhar a razão psicodinâmica subjacente.
As condições de delimitação da análise marcam a separação entre a relação analítica e as outras partes da vida, com o propósito especial de compreender o funcionamento
inconsciente do analisando.
A análise de sonhos é de crucial importância para atingir uma dimensão profunda do inconsciente.
Responsabilidades do Analista:
Este deve estar presente à hora marcada, não alterar as sessões ou os honorários sem um critério determinado.
Deve dedicar sua atenção ao analisando durante as sessões, procurando compreende-lo usando sua habilidade de analista. Deve ser objetivo e claro em suas verbalizações.
Não pode haver atividade sexual entre terapeuta e analisando, pois isto seria quebra de contrato analítico, dando origem a questões de ordem legal, ética e moral.
As questões sexuais devem ser entendidas e interpretadas como conteúdos do paciente, nunca atuadas.As fantasias sexuais, ao contrário da ação sexual direta, constituem parte integrante da relação analítica, aparecendo muitas vezes em sonhos e não na consciência vígil.
Parâmetros Analíticos e Habilidade Terapêutica.
A projeção do material inconsciente no analista, por parte do paciente, é denominada transferência e o processo inverso chama-se contratransferência. Estes fenômenos constituem boa parte do campo transformativo da análise, com mudanças de ambos os lados.
Proteção ao Analisando.
Cabe ao analista informar ao analisando quando precisa de tratamento mais intenso como hospitalização, ou encaminhar ao psiquiatra para medicação.
Deve-se ficar atento, pois o principal perigo de uma depressão severa é o suicidio e é
preciso cuidados redobrados com a orientação à família ou a quem for próximo do paciente.
Responsabilidade do Analisando.
Este deve pagar pontualmente às sessões, trazer registro de sonhos e das associações feitas às imagens oníricas, produzir desenhos, pinturas e objetos de argila ou de outro material.
Procurar revelar material emocional importante, evitando fugir das questões que o afligem.
A confidência e o sigilo são responsabilidades do analista e do analisando.
O Campo de Transformação.
Há 4 pessoas envolvidas na relação terapêutica quando são um homem e uma mulher em questão: analista do sexo masculino e sua ânima: analista do sexo feminino e seu ânimus que estarão se relacionando com o ânimus da paciente ou a ânima do paciente.
Há também 4 pessoas envolvidas quando analista e analisando são do mesmo sexo, pois a sombra dos dois também estará presente, muitas vezes determinando aspectos contratransferenciais.
A Transferência pode ser positiva ou negativa e deve ser trabalhada, pois aí estão conteúdos projetados. Esta já pode estar estabelecida antes da primeira sessão, como a contratransferência também.
Jung relata em 1946: A experiência tem demonstrado que essa projeção ( de relacionamentos primários passados) persiste com toda sua intensidade original criando assim um vínculo que corresponde, em todos os aspectos, ao relacionamento infantil inicial, com a tendência de reviver no analista todas as experiências da infância. O desajuste neurótico do paciente passa a ser transferido para o analista. Freud, o primeiro a identificar e a descrever esse fenômeno, cunhou o termo “Neurose de Transferência”.
Para Jung a Transferência contém um elemento criativo, cujo objetivo é construir um caminho para sair da neurose. Esta tem em si um objetivo, sendo sua meta criar um novo equilíbrio para a personalidade ao tornar consciente o conteúdo inconsciente.
O paciente transfere para o analista os elementos específicos necessários ao desenvolvimento da personalidade, não só recordações do passado. Precisa compreender não apenas como sua mãe e seu pai o tratavam negativamente, mas também como ele repetia esse comportamento consigo mesmo e com os outros.A medida que pode entender isto, transcende atingindo uma nova atitude e abrindo novas possibilidades de ação em sua vida.
O campo de transformação é o setting e é para os dois (analista/paciente), pois a relação é dialética e ambos se transformam.
Além da idéia de Transferência, Jung desenvolve idéias correlatas de compensação, empatia e relacionamento, que ocorrem numa análise de ambos os lados ( analista/ analisando).
Vamos abordar estas idéias:
A Compensação é o mecanismo através do qual a psique se regula automaticamente. Se, devido a resistências ou repressões excessivas, a consciência do Ego torna-se muito unilateral, desenvolve-se uma neurose. A informação que compensa a atitude consciente emerge através de sintomas específicos. A transferência, assim como a neurose, é uma tentativa de autocurar-se, levando o sistema psíquico a lutar por equilíbrio. A compensação também pode estar presente na contratransferência do analista e deve ser entendida por este.
A Empatia é a tentativa do paciente de integrar-se na personalidade do analista, ficando em harmonia com ela, buscando com isto, um bom relacionamento com este, comparando-o com relacionamentos anteriores. Nesta situação, o paciente toma o analista como ideal de ego, fazendo uma identificação introjetiva, querendo ser igual a ele, pensando que assim resolverá seus conflitos. É mais uma tentativa de cura.
Jung logo percebeu que uma característica do neurótico é a dificuldade em estabelecer relacionamentos humanos saudáveis. Inconscientemente tenta estabelecer através da transferência, mas esta tentativa está fadada ao fracasso, pois a situação patológica, não resolvida, se repete. O analista identificando esta tentativa do analisando e não atuando como seus fantasmas projetados, proporciona um caminho para romper com esta dinâmica. À medida que projeções infantis são retiradas, a necessidade de relacionamentos saudáveis vem à tona. Para Jung, o ser humano não relacionado carece de totalidade, pois ele só pode obter totalidade através da psique, e a psique não pode existir sem o seu outro lado, que é sempre encontrado no outro.
A transferência é um processo arquetípico direcional cuja finalidade é a individuação.
O nível subjetivo de interpretação tanto pode ser aplicado ao material pessoal como ao arquetípico. O material inconsciente é projetado sobre o analista nesse momento por ser necessário ao paciente integrá-lo.
A finalidade da análise é produzir a individuação e transcendência, mas isto só é possível, após a resolução dos traumas e conflitos infantis. A análise Junguiana é sintética, mas passa pela análise Freudiana.
Arquétipo do Médico Ferido ( Quíron)
Antes de termos condições de curar alguém, é necessário que tenhamos passado pela experiência de ser feridos; isto é, devemos ter tido um conhecimento direto do que é estar sofrendo e do que é buscar a cura. A cura das feridas dos outros produz um efeito terapêutico recíproco nas próprias lesões dolorosas daquele que cura.
Os que abraçam a profissão de analistas em geral o fazem partindo de uma posição original como um paciente que sofre. A dor psicológica faz com que o futuro terapeuta tenha de trabalhar bastante as próprias feridas, de forma a poder viver uma vida pessoal satisfatória. As feridas, entretanto, raramente são curadas definitivamente.Há uma vulnerabilidade que pode ser ativada pela proximidade das feridas alheias. No trabalho analítico, o inconsciente do analista é penetrado pela dor do paciente e o terapeuta torna-se psiquicamente contaminado pelas projeções a que está exposto.Assim, quem cura é ferido outra vez por absorver a doença do outro.
Estar ferido não é apenas um destino inevitável e doloroso, é também um aspecto necessário para ajudar os outros. Só pelo conhecimento adquirido na tentativa de curar as próprias feridas é que o terapeuta pode ajudar os outros. Além disto, o terapeuta não cura o outro diretamente, ele ativa o processo de cura no inconsciente do paciente. O analista serve como um modelo de pessoa curada. Isto constela o arquétipo do curador ferido no inconsciente do paciente, e é o que na verdade produz a cura e não o analista.
A análise é uma ciência e uma arte segundo Jung: uma relação pessoal no âmbito de um quadro profissional de natureza impessoal.
A Contratransferência e sua importância.
Na literatura psicanalítica, a primeira afirmação explícita sobre o valor positivo da contratransferência foi feita por Paula Heimann em 1950. Sua suposição básica era de que o inconsciente do analista entende o do paciente.
Na terapia, o analista será afetado pelas emoções do paciente, e não pode fazer mais do que estar consciente do fato de que está afetado… É mesmo seu dever aceitar as emoções do paciente e refleti-las como um espelho.
A partir da idéia de Jung do valor da introjeção, pelo analista, da patologia do paciente, Fordham desenvolveu o conceito de contratransferência sintônica. Esta idéia é semelhante a de Racker sobre contratransferência útil e à de Adler sobre contratransferência verdadeira.
A intervenção terapêutica construtiva é a expressão de um intercâmbio, em que conteúdos psíquicos passam inconscientemente do paciente para o analista e, depois, conscientemente do analista para o paciente, através da introjeção dos afetos projetados e do entendimento destes pelo analista que os devolve de forma a serem elaborados.
O que pode ser sentido voluntariamente pelo analista sobre o paciente é limitado pelo desenvolvimento psicológico pessoal do analista. Se um assunto em particular provoca excessiva ansiedade e rejeição no analista, este não será capaz de empaticamente sentir e identificar aquele tema no inconsciente do paciente. Uma análise bem sucedida depende de até onde o próprio analista fez análise. Se ele mesmo tem um tipo infantil de desejo do qual ainda está inconsciente, nunca será capaz de abrir os olhos de seus pacientes para esse perigo.
O Processo de Análise.
O curso da análise, como o curso da própria vida, encontra-se em contínua transformação, de acordo com a emergência imprevisível de novas e diferentes formas de ser. Somos livres para falar do presente ou do passado, do mundo interior ou do mundo exterior, da vida cotidiana.
Esta liberdade nos revela como somos, nos despindo das máscaras, das defesas, das ilusões a cerca de nós mesmos e dos outros.
Começamos a integrar a sombra, que significa a retomada de aspectos da personalidade que estavam perdidos no inconsciente, enriquecendo inevitavelmente o Ego.
A análise passa por etapas. Vamos descrevê-las abaixo.
Pimeira Etapa: Auto- Exame.
Examinar da forma mais honesta possível o material que surge da vida diária do paciente, sua história pregressa, sonhos, sua transferência e a contratransferência do analista.
O Self estará pressionando, para levar a pessoa ao processo de individuação.
A auto-observação analítica, mesmo realizada com a ajuda do analista, requer, tanto coragem moral quanto capacidade de percepção, ingredientes essenciais do trabalho bem sucedido no âmbito da análise.
Segunda Etapa: Compaixão Consigo Mesmo.
É importante auto-crítica. A severidade da auto crítica pode ser fruto de cisão primitiva. A auto crítica deve levar à reflexão, amadurecimento, mudanças, reparações, auto- conhecimento com análise da sombra.
Ser compassivo consigo mesmo, também é atitude narcísica e não ajuda no crescimento pessoal.
Estágios do Processo Analítico.
O processo analítico é Circunvolutivo e prevê alguns estágios.
- Estágio Analítico:
O primeiro passo é estabelecer o contrato onde deve ser combinado o preço, número de vezes por semana, sigilo, faltas, férias.
O trabalho inicial ocorre através da Persona do paciente. O analista deve estar disponível, não ser crítico, saber escutar sendo permissivo, protetor e potente.
Com o espaço livre e protegido a Persona cai. O paciente muitas vezes vai descobrir a severidade de seu Superego, pois descobre o quanto é crítico consigo mesmo e projeta isto no exterior.
A Persona nem sempre é deixada totalmente, pois o paciente muitas vezes guarda algum segredo por muito tempo. Isto é Resistência. Estas revelam pontos nodais nos quais há crises de auto-imagem, com severo auto-julgamento. Perceber é ficar face a face consigo mesmo como o verdadeiro problema.
A capacidade de vestir a persona como uma roupa que nos veste de modo apropriado para uma dada ocasião sem esconder a pessoa real que o veste, é uma valiosa aquisição e o marco de uma análise bem sucedida. Isto quer dizer que a Persona deve ser permeável.
A próxima tarefa é a identificação e a integração da Sombra. Esta é revelada por trás da Persona.
Persona e Sombra surgem juntas na infância, como resultado da classificação dos comportamentos em aceitáveis e inaceitáveis.
A sombra é de fácil identificação: basta olhar para a pessoa mais próxima do mesmo sexo que apresente características de que realmente não gostamos ou realmente desaprovamos. Nos sonhos e fantasias aparece com a mesma identidade sexual do Ego. A sombra contém algumas qualidades necessárias ao avanço do crescimento da personalidade. Tanto Persona como Sombra podem ser consideradas, em larga medida, extensões do Ego, podendo ser integradas num grau significativo.
A nima e o nimus são estruturas relacionais, que ligam a esfera pessoal do Ego às camadas mais profundas da psique objetiva ( o inconsciente coletivo), ou se forem projetadas para o exterior, ligam o Ego a aspectos do mundo da consciência coletiva.
A integração da nima e do nimus é um passo importante e difícil, pois costumam ser projetados. O fascínio ou paixão por uma pessoa mostra esta projeção. O analista pode ser foco desta projeção. Estes podem ser identificados nos sonhos como figuras do sexo oposto ao sonhador. Podem ser negativos e positivos.
Através da imaginação ativa podemos formar diálogos com nossos arquétipos.
- Estágio da Síntese.
Quando os grandes arquétipos estiverem integrados uma boa parte do trabalho já estará pronto.
O estágio de síntese envolve a integração no cotidiano daquilo que já foi trabalhado e conscientizado. É um trabalho bastante árduo, pois é por na prática o que foi integrado na análise. Com isto o Ego se fortalece tornando-se mais abrangente e mais humilde.
Há uma integração profunda com o inconsciente coletivo e a consciência coletiva. O Self passa a ser o centro integrador da personalidade. Esta se livrou das defesas narcísicas e da Persona alienante.
A função transcendente vem à tona. Esta é a capacidade de superar a tensão entre os opostos através da criação de uma forma simbólica que transcende o nível de tensão. Há uma crescente consciência do destino particular, acompanhada da liberdade de traçá-lo segundo os próprios padrões.
- Análise como Estágio.
A análise deve durar o tempo que for necessário.
Uma análise bem sucedida leva ao amor fati ( amor ao próprio destino). Isto
quer dizer: o fato de sermos capazes de viver com paixão e profundidade em todas as situações históricas em que nos encontrarmos, retornando à sociedade com mãos que concebem dádivas oferecendo aos outros aquilo que foi obtido através de sua própria jornada interior.
A conclusão bem sucedida da Análise Junguiana nos devolve ao mundo como pessoas mais profundas e integradas, capazes de percorrer a estrada da individuação contando apenas com a contenção e orientação internas , conforme a necessidade,das profundezas da nossa própria psique. Ficamos mais próximos dos outros e mais abertos a eles, e,
simultaneamente, continuamos a ser – de forma mais completa- aquela pessoa que realmente somos.
- Início/ Fim da Análise.
É mais fácil determinar quando se deve começar uma análise do que quando se deve terminá-la. No término o sentimento do analista se assemelha mais ao orgulho pleno de contentamento de ver seu próprio filho amadurecer e deixar a casa paterna.
A análise deve durar o tempo necessário para se atingir o objetivo proposto, que pode ser situacional como pode ser mais amplo.
Deve se fazer as seguintes perguntas: Os problemas foram solucionados ou entendidos e estão sendo administrados a contento?
Alguma área do problema ainda está sendo evitada?
Há alguma reação emocional com relação ao analista, que não esteja sendo expressa?
No encerramento natural da análise, pode-se interromper o procedimento por uns três meses e depois retomar e avaliar este período. Se o analisando quer parar, isto deve ser
trabalhado como conteúdo e se for o caso, deve ser avisado com um mês de antecedência para que sejam fechadas questões que estão sendo trabalhadas.
Mesmo uma análise encerrada com a aprovação de ambas as partes, pode ser retomada em outro momento se houver necessidade. O sentimento que fica entre analisando e
analista é de respeito mútuo.
- Técnicas de Representação:
Estas são técnicas bastante usadas que facilitam a projeção dos conteúdos que devem ser trabalhados.Moldar em argila, redação de poemas, dançar, tabuleiro de areia, escrever cartas a uma pessoa significativa mesmo que já tenha falecido, e escrever a resposta que pensa que receberia. A troca de cartas pode ser valiosa e trazer muito
material inconsciente. Também utiliza-se a técnica da cadeira vazia da gestalt e técnicas do psicodrama.
No tabuleiro de areia podem ser construídos a família, o casamento, o conceito de Deus, e outras idéias que queiram ser representadas.
O paciente pode construir e desconstruir, organizar e reorganizar, etc.
A amplificação usada para interpretar e entender os sonhos podem ser usadas também no tabuleiro de areia: pessoal, cultural, arquetípica e natural.
É usada também a Hipnoanálise:A Imaginação Ativa é um tipo de hipnoanálise.
Seu objetivo é promover interação direta com o pensamento inconsciente,num estado de imaginação controlado com a pessoa desperta. Assemelha-se à auto- hipnose. É uma forma de meditação. Deve-se imaginar como se estivesse atuando no cotidiano, isto é, focalizando os problemas que quer enfrentar.Deve-se permitir que as pessoas que habitam a imaginação reajam espontaneamente, como vier na imaginação, sem correção.
Dra. Denise H. Tinoco.
Psicóloga Clinica.
Steinberg, W. Aspectos clínicos da Terapia Junguiana. São Paulo. Cultrix. 1992.