Anunciando uma Nova Vida A Psicologia Obstétrica em prol do “Nascer Bem por um Mundo Melhor” Uma abordagem Psiconeuroendocrinoimunológica
Anunciando uma Nova Vida A Psicologia Obstétrica em prol do “Nascer Bem por um Mundo Melhor” Uma abordagem Psiconeuroendocrinoimunológica
Convidamos o leitor a mergulhar no que existe de mais valioso no Planeta Terra: A Vida. Sabemos que o período intrauterino registra nossas primeiras experiências afetivas que irão fazer parte do nosso arcabouço emocional, daí a importância de nos dedicarmos a um cuidado especializado durante o processo reprodutivo. A Psicologia Obstétrica se dedica a esse cuidado utilizando recursos técnicos desenvolvidos à partir do conhecimento científico.
Nosso itinerário transitará brevemente pela Psicodinâmica do Ciclo Gravídico Puerperal; pelo Modelo Psiconeuroendocrinoimunológico do Stress; pelas origens, fundamentos teóricos e recursos assistenciais desenvolvidos pela Psicologia Obstétrica com ênfase no Pré Natal Psicológico; e, finalmente na Formação Transdisciplinar da Psicologia O leitor perceberá que não utilizamos uma linguagem psicológica ortodoxa propositalmente para que a leitura seja palatável.
Ciclo Gravídico Puerperal (CGP)
O CGP é um período permeado por alterações físicas e psíquicas em ambos os parceiros. A forma como o casal grávido vivencia essas alterações irá determinar se esse período será fértil para o desenvolvimento emocional e amadurecimento ou, se poderá desencadear transtornos psíquicos que podem comprometer a saúde mental materna e paterna. ¹
O CGP um período de crise previsível e está exposto a fatores stressores inerentes ao processo reprodutivo. A maneira como cada indivíduo responde aos fatores stressores é singular, depende da sua personalidade, história pregressa e do momento de vida atual.²
As condições da concepção podem ser fatores stressores, o que não significa que o processo reprodutivo esteja fadado a intercorrências físicas ou psíquicas. O futuro da saúde mental e física depende da forma de enfrentamento das situações stressoras. ³
O CGP inicia no período pré gestacional, quando o casal decide engravidar, transita pelos períodos gestacional, perinatal e puerperal, sendo este último considerado no mínimo até o 3º mês pós parto, ocasião em que ocorre o Parto Psicológico. ²
Psicodinâmica do CGP
Para compreendermos o trânsito psíquico do casal grávido necessitamos dos conceitos fundamentais da Psicodinâmica do Ciclo Gravídico Puerperal. Essa nos fornece subsídios para elaboração do diagnóstico intrapsíquico e situacional, o qual indicará os focos a serem trabalhados em prol do Bem Estar e Qualidade de Vida do Casal Grávido.
O CGP é permeado por alterações emocionais consideradas fisiológicas, as quais demandam recursos de enfrentamento diversos daqueles disponíveis no arcabouço psíquico, configurando um novo cenário para o casal grávido, podendo o crescimento ou, comprometer a saúde mental. 4
Ao longo da gestação a mulher vai construindo um mundo psíquico exclusivo do binômio mãe-feto.
Dentre as alterações mais comuns ressaltamos a Regressão, Introversão, Identificação com o Feto, Intuição, Ambivalência Afetiva, Hipersensibilidade, Oscilações de Humor. Desejos, aversões, alterações no paladar e apetite irão se manifestar de forma singular e frequentemente estão associados a fatores emocionais. Insonia e hipersonia são alterações que podem se revezar e muitas vezes indicar angústias a serem investigadas.
Modelo Psiconeuroendocrinoimunológico do Stress
Realizamos a interface da Psicodinâmica do CGP com o Modelo Psiconeuroendocrinoimunológico do Stress para solidificar nossa atuação.
A rotina é permeada por fatores stressores que necessariamente não são vivenciados como stress. A reação de stress é singular à forma com que cada indivíduo enfrenta as situações. 5
O stress pode ser positivo conhecido por Eustress ou negativo denominado de Distress. A mesma situação pode ser eustressante para uma pessoa e distressante para outra, podendo se alterar na mesma pessoa. A frequência e intensidade dos fatores stressores que irão propiciar o desencadeamento das reações de stress e o adoecimento.
Os recursos de enfrentamento para os fatores stressores são conhecidos como coping. Este é o processo de recrutamento de registros do aparelho cognitivo (identificação, memória, associação) utilizados para criar uma reposta adequada e eficiente aos fatores stressores. Dele depende a constituição ou não do estado de distress. Se a resposta for eficiente teremos o eucoping, caso contrário, o discoping. A saúde física e psíquica do indivíduo depende dessa dinâmica conforme observado na Figura 1.
Figura 1 – Stress, Coping, Burnout, Resiliência
Psicologia Obstétrica
Psicologia Obstétrica é um conjunto de ações psicoprofiláticas e psicoterápicas que se utilizam da fundamentação teórica da Psicodinâmica do CGP para elaboração do diagnóstico intrapsíquico/situacional do casal grávido, intervindo preventiva e terapeuticamente de acordo com protocolos psicológicos especificamente desenvolvidos para assistir essa clientela, seja numa trajetória natural ou em circunstâncias singulares do processo reprodutivo”. (Bortoletti, 2011) 6
Segundo Bortoletti 2 as origens da Psicologia Obstétrica (PO) remontam à década de 80 (1983), no Hospital Ipiranga – São Paulo, onde foi criado o primeiro Protocolo Assistencial: o Pré Natal Psicológico. Por ocasião da sua criação foi denominado de Psicoprofilaxia da Gestação, Parto e Puerpério. Em outubro de 1985, a então gestante Roselys Anetelle de Campos o batizou de Pré Natal Psicológico. Esta última denominação ganhou a simpatia dos casais grávidos e profissionais que transitam no CGP, sendo utilizada até os dias atuais.
Em 1990 a PO migra para a Universidade Federal de São Paulo, onde foram criados os Protocolos Assistenciais específicos a cada singularidade do CGP: Perdas Gestacionais Recorrentes, Óbito Fetal, Risco de Prematuridade, Hiperemese Gravídica, Medicina Fetal, Interrupção Legal da Gestação, entre outros. Neste trabalho focaremos no Pré Natal Psicológico.
Pré Natal Psicológico
Pré Natal Psicológico (PNP) é uma assistência psicoprofilática e psicoterápica personalizada, indicada em toda e qualquer gestação, utiliza um protocolo padrão do curso natural do CGP, adapta-se às particularidades de cada realidade obstétrica/fetal e prioriza a abordagem do conteúdo psíquico sem detrimento da orientação psicopedagógica e conscientização corporal terapêutica.” (Bortoletti, 2011)
O PNP tem como objetivo desenvolver atitudes de eucoping frente aos fatores stressores inerentes ao CGP, prevenindo a instalação de distress e adoecimentos físicos/psíquicos, evitando colocar em risco a saúde materna/paterna/fetal.
Preconiza três dimensões de intervenção: Psíquica, Cognitiva, Corporal. É justamente a intervenção destas três dimensões que caracteriza o PNP, diferenciando-o das demais intervenções com gestantes. A abordagem parcial seja da dimensão psíquica, cognitiva ou corporal não se mostra efetiva para atingir o objetivo tanto de tratamento como prevenção. 7
A Dimensão Psíquica atua nas manifestações da Angústia decorrente dos conteúdos emocionais latentes ou conscientes, identificando fatores de distress e desenvolvendo recursos de eucoping eficazes no enfrentamento das situações stressoras. Utiliza a abordagem Psicodinâmica do Ciclo Gravídico Puerperal em interface com a abordagem Psiconeuroendocrinoimunológica .
A Dimensão Cognitiva atua nas manifestações da Ansiedade identificando o distress desencadeado pelo medo do desconhecido, substituindo pelo eucoping. Utiliza recursos psicopedagógicos criteriosamente escolhidos para abordar conteúdos acerca do Ciclo Gravídico Puerperal.
A Dimensão Corporal atua na Conscientização Corporal através de técnicas de Meditação Terapêutica, Relaxamento, Respiração, Massagens, Simulado de Parto e Dessensibilização de Cesárea.
O Pré Natal Psicológico é indicado em toda e qualquer gestação, independentemente da realidade obstétrica/fetal que se apresente. Circunstâncias especiais requerem a utilização de protocolos adequados.
É extensivo aos avós, pois estes revivem sua própria maternidade/paternidade durante o processo reprodutivos dos filhos, cenário que favorece o desencadeamento de atitudes iatrogênicas. Traze-los tem como objetivo transformá-los em agentes preventivos de transtornos psíquicos.
O PNP de abordagem Psiconeuroendocrinoimunológica é um instrumento efetivo no tratamento e prevenção de processos de distress, os quais podem comprometer o trânsito natural do processo reprodutivo e a saúde física/mental do casal grávido.
Formação em Psicologia Obstétrica
Para desenvolver essa abordagem é necessária uma Formação especializada. Em 1986 a PO desenvolveu seu primeiro Curso de Especialização contemplando a abordagem interdisciplinar necessária à formação da Psicóloga(o) Obstétrica(o).
Em 2.000 a formação de Psicólogas(os) Obstétricas(os) foi contemplada com um vasto campo de Prática Assistencial na Universidade Federal de São Paulo, se transformando em Pós Graduação Lato Sensu em Psicologia Obstétrica, reconhecida pelo MEC.
Em 2011 a PO iniciou o Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Mulher expandindo suas atividades ao Ambulatório de Endometriose. Neste a assistência psicológica inicia no período pré gestacional, objetivando desenvolver recursos de enfrentamento efetivos relacionados aos registros de distress da história de vida da paciente que possam comprometer o processo reprodutivo.
Atualmente a Formação em Psicologia Obstétrica contempla a abordagem Transdisciplinar: Psicologia da Saúde, Psiconeuroendocrinoimunologia, Neuropsicologia, Obstetrícia, Neonatologia, Fisioterapia e Nutrição Obstétrica, Práticas Integrativas.
Durante a pandemia do Covid 19 nasce uma nova modalidade de Formação online que está se mostrando altamente eficaz na formação de Psicólogas(os) Obstétricas(os), o GEPO – Grupo de Estudos em Psicologia Obstétrica. Uma abordagem personalizada que demanda um olhar técnico experiente e cuidadoso.
O GEPO cuida da(os) Psicólogas(os) Obstétricas(os) priorizando as questões emocionais da(o) aluna(o), seu conhecimento no que tange aos Fundamentos Teóricos e Protocolos Assistenciais da PO e a aplicação adequada destes no desempenho da Prática Assistencial.
Cuidar da Equipe de Saúde é um compromisso da PO e não poderia ser menos atenta aos Psicóloga(o)s Obstétricas(os), uma vez que os profissionais que laboram no CGP apresentam um risco aumentado para a instalação da Síndrome de Burnout. 8
O compromisso social da Psicologia Obstétrica é com o “NASCER BEM POR UM MUNDO MELHOR”.
Aline Tomasi
Psicóloga
Aline Tomasi Paulino, Psicóloga na UNIFESP, Psicoterapeuta, Psicóloga Hospitalar, Psicóloga Obstétrica, Professora nos cursos de Extensão, Aprimoramento e Especialização em Psicologia Obstétrica, Professora do GEPO, Professora do IBIPO
Fátima Bortolletti
Psicóloga
Fátima Ferreira Bortoletti, Mestre em Ciências da Saúde pela UNIFESP, Psicóloga na UNIFESP, Psicoterapeuta, Psicóloga Hospitalar, pioneira na Psicóloga Obstétrica, Coordenadora nos Cursos de Extensão, Aprimoramento e Especialização em Psicologia Obstétrica, Coordenadora do GEPO, Organizadora do livro Psicologia na Prática Obstétrica, diretora fundadora do IBIPO
Magda Consul
Psicóloga
Magda Spinello Consul da Silva, Psicóloga na UNIFESP, Psicoterapeuta, Psicóloga Hospitalar, Psicóloga Obstétrica, Professora nos cursos de Extensão, Aprimoramento e Especialização em Psicologia Obstétrica, Professora do GEPO, co-autora de vários capítulos em Psicologia Obstétrica, Professora do IBIPO
¹ Bortoletti FF. Psicodinâmica do ciclo gravídico puerperal. In: Psicologia na Prática Obstétrica – Uma abordagem Interdisciplinar. Editora Manole, São Paulo, 2007. P 21 – 31
² Bortoletti FF, Vasconcellos EG, Silva MSC – Pré natal psicológico – Abordagem Psiconeuroendocrinoimunológica no ciclo gravídico puerperal. In: Book of Proceedings V Congresso Ibero Americano de Psicologia da Saúde Faro – Algarve , 2019. P 218-225
³ Vasconcellos EG. Stress, Coping, Burnout, Resiliência: Raízes do mesmo tronco. In: Silva Jr N, Zangari W. (organizadores) Psicologia Social e a questão do hífen . Editora Bluher, 2017. Cap 20
4 Bortoletti FF, Silva MSC, Tirado MCBA. Aspectos emocionais á luz da Psicodinâmica do Ciclo Gravídico Puerperal.In: Moron AF, Kulay L, Camano L. Obstetrícia. Editora Manole, 2011, SP. p 177-194
5 Vasconcellos EG. O Modelo Psiconeuroendocrinológico de Stress. In: Seger L. Psicologia e Odontologia. Editora Livraria Santos, São Paulo, 4ª edição, 2002 p 135-160
6 Bortoletti FF. Assistência Psicológica no Ciclo Gravídico Puerperal. In: Briquet R. Obstetrícia Normal. Editora Manole, 2011, SP. p 261-278
7 Bortoletti FF. Psicoprofilaxia no ciclo gravídico puerperal. In: Psicologia na prática obstétrica – Uma abordagem Interdisciplinar. Editora Manole, São Paulo, 2007. P 21 – 31
- Moreno-Jimenez B, Herrer MG, Hernández EG. Burnout: sofrimento psíquico dos profissionais que atuam em obstetrícia. In: Psicologia na Prática Obstétrica – Abordagem Interdisciplinar. Editora Manole, São Paulo, 2007. P 123-130